A coccidiose, direta ou indiretamente, é responsável por mais da metade dos problemas de saúde das aves de gaiola. Causada por protozoários, parasitas do epitélio intestinal. Os gêneros de interesse para a avicultura são Eimeria e Isospora sendo que o segundo tem nos pássaros seu hospedeiro. Daí poder-mos nos referir à doença no como Isosporose. Esses coccidas são muito bem sucedidos, por terem desenvolvido um ciclo reprodutivo assexuado, no interior das células e sexuado fora delas, produzindo oocitos extremamente resistentes, que são eliminados com as fezes e completam seu desenvolvimento, com a esporulação, fora do hospedeiro.
Os oocitos possuem uma camada externa impenetrável para os desinfetantes empregados nos criatórios (imune a Iodo, Ácido Cresílico, Hipoclorito de Sódio, Formalina, Sulfato de Cobre, Ácido Sulfúrico, Diclorado de Potássio, Formaldeído e muitos outros, nas concentrações comercias). Quando ingeridos pelo hospedeiro, o aparelho digestivo se encarrega de corroer a membrana dos oócitos liberando os esporozóitos que penetram nas células do intestino, dando inicio a reprodução assexuada e multiplicando-se até romper-lhe a membrana, migrando para outras células. Assim por algumas gerações, até se tornarem seres sexuados, que, fora do ambiente intracelular, produzirão novos oócitos imaturos, que serão eliminados com as fezes.
Corte de intestino corado em roxo H. E. e aumentado 400 vezes mostra
os aglomerados de bactérias oportunistas em infecções secundárias.
Os meios de contaminação são sempre mecânicos. Os oócitos são transportados no manuseio do material, levados para outros locais ligados ao vestuário das pessoas, principalmente calçados.
Também podem ser levados pelo vento, em partículas secas de dejetos contaminados. Podem permanecer ativos em um ambiente por muitos meses em condições ideais de temperatura e umidade.
Quase todos os pássaros são infestados por coccidas. As defesas do organismo mantêm o controle da infestação em um nível aceitável. É praticamente impossível erradicar as coccidas de um criatório.
E também seria indesejável exterminar totalmente as isosporas do plantel. Sem contato com as isosporas, as defesas do organismo dos nossos pássaros não seriam estimuladas, e uma ingestão de oócitos, por um organismo despreparado, poderia ser fatal.
Embora não seja transplacentária, isto é, não é transmitida da mãe para o filhote, através do ovo, o filhote é contaminado por oócitos presentes no ninho, eliminados pela fêmea, nos primeiros dias de vida. Os próprios ovos já apresentam oócitos na parte exterior das suas casas. Daí, ser essa uma fase crítica da criação. Nos primeiros dias de vida, o filhote é contaminado. Sem defesas orgânicas preparadas para enfrentar as coccidas pode facilmente perecer.
Não há um único medicamento que mate todos os coccidas e permita que o pássaro continue vivo.
A vacinação seria ótima solução. As vacinas, no entanto, são de alto custo de produção, e, como os coccidas (mais de 600 espécies) são hospedeiro-específicos, a produção de vacinas deve ser própria para cada espécie de hospedeiro. Usar em pássaros, vacina contra coccidiose aviária fabricada para emprego em frangos de corte é um procedimento inócuo.
Nos resta manter a infestação dos nossos pássaros sob controle. A quantidade de 1 ou 2 oócitos por gramo de fezes é considerada adequada. Um pássaro nessa condição de infestação se mantém saudável, em absoluto equilíbrio sanitário. A coccidiose está presente, no entanto, assintomática.
Essa é a realidade de quase todos os pássaros de gaiola.
Qualquer fator que comprometa as defesas orgânicas de um pássaro poderá leva-lo à manifestação de um quadro agudo de isosporose. Daí a grande possibilidade de avaliação incorreta do problema de saúde que acomete o pássaro. Um pássaro que foi submetido a uma corrente de ar frio poderá terminar por apresentar um quadro de isospose. O criador inexperiente dificilmente associaria uma coisa à outra, pensando apenas em um possível problema no aparelho repiratório. A presença do veterinário e o exame de fezes são fundamentais nessa hora.
As paredes do intestino, danificadas por um quadro agudo de coccidiose, formam ambiente adequado ao desenvolvimento de outras bactérias, causando infecções secundárias que poderão exigir atibioticoterapia específica.
Em pássaros adultos é mais comum a ocorrência de casos de isosporose na época da muda de penas, quando os pássaros estão mais debilitados. Passaros estressados por viagens e participações em torneios estão mais suscetíveis de apresentar a doença.
A falta de higiene com poleiros e comedouros, e de grade impedindo que o pássaros tenham contato com as próprias fezes, permitem que ele ingira oócitos que foram produzidos em seu próprio intestino. Para cada oócito ingerido, milhares de células serão comprometidas e a multiplicação das coccidas aumentará em progressão geométrica.
A Prevenção A prevensão de casos de coccidiose no plantel é reforça pela higiene adequada.
Uma dieta equilibrada, suplementada de forma adequada por vitaminas, minerais e aminoácidos essenciais, e, enriquecida com simbióticos (exclusão competitiva dos organismos potencialmente patológicos na microbiota intestestinal) se constitui em poderosa arma para prevenção da coccidiose.
O emprego sistemático de medicamentos coccidiostáticos, principalmente em doses sub-clinicas, copiado da avicultura de produção, nos leva a correr o risco de tornarmos os coccidas resistentes aos princípios ativos empregados, exigindo super-dosagens e novos medicamentos para o seu controle.
Muitos criadores manejam seus planteis com tratamentos preventivos ministrados em determinadas épocas do ano, principalmente início da muda e início da temporada de reprodução.
Tantos outros ministram coccidiostáticos, do penúltimo dia de choco (para que a fêmea elimine menos oócitos no início da vida do filhote) até o 10° dia de vida dos filhotes.
Alguns passarinheiros, afeitos aos torneios, ministram cocciodiostáticos, de forma preventiva, desde um dia antes da viajem até dois dias após retorno do pássaro ao criatório.
Diagnóstico O diagnóstico preciso é obtido pelo exame das fezes do pássaro. Preferencialmente, as fezes devem ser colhidas em diferentes horários e dias. Os oócitos não são eliminados, necessariamente a cada vez que o pássaro defeca. Um pássaro poderá estar com um nível de infestação significativo e não ter oócitos identificados em determinada amostra de material colhido.
O pássaro acometido de coccidiose ou isosporose, apresenta-se indisposto, embolado. Permanece mais tempo que normal junto ao comedouro e ao bebedouro. Isso por estar com a absorção de nutrientes comprometida pelo dano causado pelos coccidas às células do intestino. É comum que o desconforto, causado pela dor, leve o pássaro a jogar muitas sementes para fora do comedouro, a descascar quebrar e derrubar sementes no comedouro. Em estágios mais avançados poderá ocorrer a conhecida diarréia branca. Que não é uma diarréia. Com a falta de nutrientes absorvidos da alimentação, o organismo ataca as reservas existentes nos tecidos adiposo e muscular, liberando uratos nas fezes, tornando-as esbranquiçadas. Daí a perda de massa muscular que destacará o osso do peito em forma de facão, conhecida vulgarmente por peito seco.
Devemos ficar atentos para outros problemas que levam às fezes demasiadamente brancas. Deficiência no equilíbrio da dieta, problemas com o bico, língua, e muitos outros. Ao identificarmos fezes brancas devemos observar para diferenciar se o pássaro está comendo muito e não está aproveitando os nutrientes, se não está comendo ou se esta consumindo uma dieta desequilibrada.
Poderá haver diarréia, normalmente com presença de sangue. Nesses casos o pássaro se desidrata rapidamente e morre.
O ventre poderá se apresentar com volume aumentado, como em pássaros acometidos de obesidade.
Um pássaro forte, com as defesas orgânicas em boas condições, poderá apresentar apenas uma significativa queda de desempenho, ficar embolado por alguns momentos e animar-se com a aproximação do tratador, voltando a se movimentar normalmente. Essa situação poderá perdurar por muito tempo até que ele entre na fase crítica da doença.
É preciso estar-mos atentos para o fato de que outra doença poderá acometer o pássaro, comprometer suas defesas e reservas e facilitar o desenvolvimento das coccidas. Também um quadro de coccidiose poderá danificar muitas células do intestino, criando um ambiente favorável ao desenvolvimento de outras bactérias, causadoras de infecções secundárias. Ainda há outras doenças apresentam sintomas semelhantes. Tudo isso dificulta o diagnóstico sem o resultado de exames dos dejetos.
Exames de rotina no plantel e os tratamentos preventivos que se fizerem necessários contribuirão muito com a condição sua condição sanitária.
Tratamento Não existe remédio milagroso. As coccidas estão se tornando cada vez mais resistentes aos produtos de uso mais comum.
Os medicamentos podem ser coccidicídas, quando se destinam a matar as coccidas, ou coccidiostáticos, quando interferem no seu ciclo reprodutivo, reduzindo a produção de oócitos.
Nenhum deles acabará com todos as coccidas. Os coccidicidas costumam ser mais agressivos ao organismo do pássaro tratado.
O tratamento a base de sulfas, que atuam na fase da reprodução sexuada das coccidas, conforme a dosagem e a duração, poderá causar azoospermia, com a esterilização temporária ou permanente dos galadores. A sulfametazina apresenta a vantagem de ser indicada, também contra a mycoplasmose e a salmonelose, ampliando o espectro na indicação do tratamento.
A tetraciclina já foi muito usada, mas pela continuidade do seu emprego teve sua eficiência comprometida pela progressiva resistência das coccidas e de outras bactérias, exigindo dosagens cada vez mais fortes.
O NF-180 pó, foi empregado com sucesso por muito tempo, mas está com sua comercialização proibida no Brasil.
O Amprolbase, produzido pela Farmabase, mostra-se eficiente como preventivo, não apresentando bom resultado na medicação de pássaros com quadro agudo de coccidiose.
O Clopindol ou Clopidol, como é conhecido no Brasil o Metilclorpindolo, presente no Coccinon da Angercal e no Coccidex da Vitasol, tem-se mostrado o mais adequado para o tratamento da coccidiose dos pássaros de gaiola.
Juntamente com o cocciostático deve ser ministrado um complexo vitamínico com vitamina A, que irá ajudar na reparação do intestino atingido, com vitamina K para minimizar possíveis hemorragias, com vitamina C que apresenta propriedades anti-infecciosas e apóia o restabelecimento das defesas orgânicas e vitaminas do grupo B, especialmente as vitaminas B2 e B12, que revigoram o organismo debilitado. No caso de tratamento com sulfas, vitaminas do grupo B devem ser evitadas por antagonizarem a ação das mesmas. Em casos agudos da doença um soro re-hidratante acrescido de energético (açúcar de uva ou dextrosol) é fundamental para devolver ao pássaro as condições mínimas necessárias para volte a se alimentar.
Alguns criadores afirmam usar com sucesso o Clavulim 250, de uso humano, mas é uma iniciativa empírica, desamparada de estudo científico comprobatório.
É prática usual da maioria dos criadores empregar um cocciodiostático sempre que um pássaro da sinais de não estar bem de saúde. Não é um procedimento desprovido de fundamento, pois para a maioria dos criadores é difícil dispor de acesso aos necessários exames de fezes, diagnóstico e prescrição veterinária em tempo hábil para a recuperação do pássaro.
Considerando que a presença de coccidas no organismo do pássaro é, no mínimo, muito provável, minimizar o nível da infestação no pássaro doente, mesmo que a causa da doença seja outra, é extremamente desejável.
Um pássaro que arrepiou a plumagem (embolou) e demonstrou apatia deve receber um cocciostático imediatamente. Se o seu problema de saúde estiver restrito à coccidiose é de se esperar que, no máximo no terceiro dia de tratamento, apresente significativa melhora. Mesmo em caso de aparente recuperação o tratamento não deve ser inferior a 10 dias.
Costumamos empregar como medicação emergencial a associação de coccidex (uma cápsula em 50 mL de água) com 10 gotas de R-Trill. Temos tido grande sucesso com esse tratamento.
Caso não reaja positivamente com esse tratamento, em até 3 dias, o tratamento deve ser modificado.
Essas recomendações prestam-se apenas aos casos emergenciais, em que não é possível recorrer ao veterinário ou efetuar exame de fezes.